terça-feira, julho 18, 2006

Tentações do Apocalipse



Tentações do Apocalipse

Não é de poesia que precisa o mundo.
Aliás, nunca precisou. Foi sempre
uma excrescência escandalosa que
se lhe dissesse como é infame a vida
que não vivamos para outrem nele.
E nunca, só de ser, disse a poesia
uma outra coisa, ainda quando finge
que de sobreviver se faz a vida.
O mundo precisa de morte. Não da morte
com que assassina diariamente quantos teimam
em dizer-lhe da grandeza de estar vivo.
Nem da morte que o mata pouco a pouco,
e de que todos se livram no enterro dos outros.
Mas sim da morte que o mate como um percevejo,
uma pulga, um piolho, uma barata, um rato.
Ou que a bomba venha para estas culpas,
se foi para isso que fizemos filhos.
Há que fazer voltar à massa primitiva
esta imundície. E que, na torpitude
de existir-se, ao menos possa haver
as alegrias ingénuas de todo o recomeço.
Que os sóis desabem. Que as estrelas morram.
Que tudo recomece desde quando a luz
não fora ainda separada às trevas
do espaço sem matéria. Nem havia um espírito
flanando ocioso sobre as águas quietas,
que pudesse mentir-se olhando a criação.
(O mais seguro, porém, é não recomeçar.)

Jorge de Sena


de Peregrinatio ad loca infecta , 1969

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  • terça-feira, julho 11, 2006

    Edgar Allan Poe



    O Vale Da Inquietude

    Dantes, silente vale sorria.
    Era um vale onde ninguém vivia.
    Haviam todos partido em guerra,
    deixando os doces olhos de estrelas
    nocturnamente velarem pelas
    flores formosas daquela terra,
    em cujos braços, dia após dia,
    a luz vermelha do sol dormia.
    Não há viajante que, hoje, não fale
    sobre a inquietude do triste vale.
    Lá, agora, tudo é só movimento,
    excepto os ares, pesando, adustos,
    nas soledades de encantamento.
    Ah! nenhum vento move os arbustos
    que vibram como as ondas geladas
    em torno às Hébridas enevoadas!
    Ah! nenhum vento essas nuvens guia,
    murmurejantes, nos céus insanos,
    e que se arrastam, por todo o dia,
    sobre violetas, que alguém diria
    serem milhares de olhos humanos,
    e sobre lírios, de haste pendida,
    chorando em tumba desconhecida,
    tremendo; e sempre caem, com o perfume,
    gotas de orvalho do flóreo cume,
    chorando; e desce, nas hastes frias,
    um pranto eterno de pedrarias.

    Edgar Allan Poe

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  • segunda-feira, julho 10, 2006

    Mulheres na Literatura


    EM NOME


    Em nome da tua ausência
    Construí com loucura uma grande casa branca
    E ao longo das paredes te chorei

    Sophia de Mello Breyner Andresen

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  • segunda-feira, julho 03, 2006

    Citação

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