domingo, abril 04, 2004

Um poema que acabo de ler

A FLOR DO MARACUJÁ

Encontrando-me com um sertanejo
Perto de um pé de maracujá
Eu lhe perguntei:
Diga-me caro sertanejo
Porque razão nasce roxa
A flor do maracujá?

Ah, pois então eu lhi conto
A estória que ouvi contá
A razão pro que nasci roxa
A frô do maracujá.

Maracujá já foi branco
Eu posso inté lhe ajurá
Mais branco qui caridadi
Mais brando do que o luá

Quando a frô brotava nele
Lá pros cunfim do sertão
Maracujá parecia
Um ninho de argodão.

Mais um dia, há muito tempo
Num meis que inté num mi alembro
Si foi maio, si foi junho
Si foi janero ou dezembro

Nosso sinhô Jesus Cristo
Foi condenado a morrê
Numa cruis crucificado
Longe daqui como o quê

Pregaro cristo a martelo
E ao vê tamanha crueza
A natureza inteirinha
Pois-se a chorá di tristeza

Chorava us campu
As foia, as ribera
Sabiá tamém chorava
Nos gaio a laranjera

E havia junto da cruis
Um pé de maracujá
Carregadinho de frô
Aos pé de nosso sinhô.

I o sangue de Jesus Cristo
Sangui pisado de dô
Nus pé du maracujá
Tingia todas as frô

Eis aqui seu moço
A estória que eu vi contá
A razão proque nasce roxa
A frô do maracujá.


[Catulo da Paixão Cearense]

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