domingo, abril 18, 2004

Diana Bellessi (Argentina - 1946)

Não me mandes para o canto

Quando digo a palavra
nuca
chupo-te suavemente
até afundar
o dente aqui?

Acaso estou te tocando?

Quando digo bico do peito
a mão roça
as dilatadas rosas dos peitos teus?

Toco-te acaso?

Toca, língua, acaso o canto
de meus lábios e aprisiona
na vasta cavidade do corpo
que deseja ser tocado e cingido
por tua língua quando nomeia
por minha boca a palavra língua, acaso?

Não me mandes para o canto

Não faças de mim a testemunha
que se olha te tocando com palavras
É a mão nomeada
não o nome
que deseja aprisionar tuas nádegas

– Fala-me
– Como será?
– O quê?
– Tua voz

Fogo oculto na madeira
do fogo que se expande?

É assim que será?
O corpo de tua voz
no instante em que
não me mandes para o canto

Flui mel das romãs

Não quero
tocar um fantasma
nem quero
a fantasia cortês
do trovador à sua dama
É a você, minha amada
áspero corpo da amiga que desejo

Gesto
de mútua apropriação

instante
onde não se sabe
os limites do tu, do eu

O nome e o nomeado
em tersa conjunção que sabe
não durará

e sabe

é mais eterno
que o gume de um diamante

Alegre
relâmpago de garra
e de mordedura
animal
o mais belo de todos
o instinto
impera aqui

Sua voz não tem tradução

Verbal moeda de intercâmbio
não
Só o audaz abraço, minha amiga,
responde aqui



(Traducão de Santiago Kovadloff)
"A palavra nômade, Editora Iluminuras, 1990 - S.Paulo, Brasil"

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